Como convidado do Dr. Durão Barroso, enquanto Presidente do Fórum Euro-África, Ulisses Correia e Silva pede uma atenção especial para os países menos desenvolvidos, para a África e para os pequenos Estados insulares em desenvolvimento

Dr. Durão Barroso, Presidente do Fórum Euro-África 2020 disse:
O mundo está a atravessar uma situação sem precedentes onde além de perdas de vidas humanas, os custos económicos são devastadores. Trata-se da maior crise desde a história económica, de que se tem registo, apenas comparativamente à grande depressão dos anos 30. Todas as maiores economias estão bloqueadas, e os números em termos de recessão, Produto Interno Bruto e desemprego são extremamente preocupantes.
A pandemia está a afetar o mundo à escala global mas de forma assimétrica, nem todos os Países e setores estão a sofrer os mesmos efeitos, daí a importância de se fazerem comparações e discutir o que pode ser feito conjuntamente entre a Europa e África. A Europa, mesmo quebrada, tem reagido relativamente bem, com as lições apreendidas da grande crise financeira de 2008, com os governos a comprometerem-se com algumas formas de mutualidade e programas mais ambiciosos em termos de apoios fiscais, além das ações do Banco Central Europeu. Não se sabe ainda até quando durará esta crise, porque as principais variáveis são-nos ainda desconhecidas: uma vacina para a COVID-19 e terapêuticas eficazes. Há sinais encorajadores a respeito de uma vacina, mas ainda sem confirmação. Igualmente ainda não podemos prever as mudanças que esta conjuntura trará, para os Países em termos de paradigmas, mas já existem mudanças de nosso conhecimento com a aceleração e desaceleração de algumas tendências como a “desglobalização”, alguma diversificação, nacionalizações em Países desenvolvidos, com a deslocalização da produção da Ásia para os respetivos territórios, o massivo aumento da digitalização, devido às restrições de contactos e outros progressos. Temos igualmente a aceleração de fricções entre os Estados Unidos da América e a China.
É do interesse da Europa e possivelmente da África, manter-se aberto para os negócios, manter os fluxos de capital, de comércio, de investimentos, de pessoas, e de estarmos comprometidos com uma ordem mundial. Não é de nosso interesse termos uma OMC que não funcione e igualmente uma OMS sem autoridade suficiente. Precisamos de continuar a trabalhar para mantermos as negociações multilaterais e manter a ordem mundial.
Temos neste momento duas frentes em colisão: os fluxos e as fricções. E quem irá ganhar? O fluxo de pessoas, de bens, de investimentos, de comércio ou as fricções de nacionalismos, protecionismos e as vezes chauvinismo e xenofobia? Esta é a realidade. É do interesse da Europa manter-se comprometida com a ordem global, porque há bens públicos globais que só podem ser alcançados em conjunto, como a sustentabilidade, a luta contra as alterações climáticas, como a paz e a segurança, a estabilidade financeira, e igualmente a saúde pública, Mesmo se tivermos diferentes regimes, de ideologias politicas, devemos continuar comprometidos com uma ordem mundial baseada nas negociações multilaterais, princípios e valores comuns. Não estamos numa situação de poder dizer “o teu barco está afundando”. Nós iremos todos sobreviver e espero que seja este o caso.
Cabo Verde é muito dependente do setor do turismo, sendo um dos três Países considerados pelo Banco Mundial, mais dependentes do turismo, sendo igualmente dos mais vulneráveis a esta pandemia.

Dr. Ulisses Correia e Silva, Primeiro-Ministro de Cabo Verde disse:
Agradeço o convite do Dr. Durão Barroso para participar deste Fórum. Antes de falar sobre Cabo Verde, gostaria de falar das condições de África, porque a condição emergencial da pandemia mostrou os altos custos de desconexões das economias umas das outras, e de se restringir a mobilidade de pessoas, bens e ideias. Todos vamos perder. Alguns mais do que outros, mas as perdas são para todos. Relativamente ao ponto, a chave da habilidade de África seguir em frente é o perdão da dívida externa, não somente para manter o equilíbrio macroeconómico, devido à crise causada pela pandemia, mas também para libertar recursos para promover mudanças estruturais, o que pode constituir um ponto crítico para o desenvolvimento sustentável do continente. Nós precisamos de alívio externo não apenas do serviço da dívida, mas também de redução significativa de participações externas, além dos atuais esforços multilaterais na África.
Uma atenção especial é preciso para os Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDC’s). Cabo Verde é um pequeno estado insular em desenvolvimento, e graduado a País de desenvolvimento médio. Um olhar especial para os Países que graduaram-se a rendimento médio, com reformas económicas e institucionais com vista a atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas. Com o perdão da dívida externa, podemos usar estes recursos para alcançarmos os objetivos estratégicos da Agenda 2030. Nós trabalhos arduamente para definir as nossas prioridades: o desenvolvimento do capital humano; qualidade da educação e melhor utilização das capacidades da Diaspora; fortalecimento do capital institucional; democracia e instituições fortes; estabilidade política e social; boa governação; baixo risco reputacional para Cabo Verde; transição energética para 50% de fontes renováveis para 2030 e 100% para 2040, incluindo a mobilidade elétrica; a economia azul, onde Cabo Verde tem mais mar do que solo, e posicionar Cabo Verde como uma plataforma marítima; agricultura inteligente, diversificada e com uso eficiente da água, incluindo a dessanilização associada às energias renováveis; capitalizar a parceria estratégica com a UE, os EUA e integração regional na CEDEAO; Cabo Verde precisa de âncoras fortes para alavancar a economia e as finanças internas e sua capacidade de reduzir as vulnerabilidades ambientais e de segurança. Esta é para nós uma abordagem win-win.